O governo federal avalia uma regra que pode fixar em cerca de 7,5% o reajuste do piso salarial dos professores da educação básica, anunciado anualmente em janeiro pelo Ministério da Educação (MEC) e que precisa ser seguido por estados e municípios.
Os novos critérios para aumentar o piso do magistério estão sendo negociados entre o MEC, o Ministério da Economia e a Casa Civil da Presidência da República e devem ser publicados numa medida provisória (MP).
Integrantes do governo discutiram nos últimos dias conceder 5% (equivalente à inflação prevista para 2022) ou 10% (a inflação do ano passado). Neste momento, prevalece a ideia de reajustar o piso em 7,5%, ao adotar critérios com reajuste considerando a flutuação da inflação em 12 meses.
O ministro da Economia, Paulo Guedes, não quer vincular o reajuste do piso à recomposição da inflação, tanto no último ano quanto para 2022. Caso seja confirmado, o reajuste faria o piso sair de R$ 2.886,24 para R$ 3.102.
As regras de reajuste do piso do magistério estão num limbo jurídico por conta do novo Fundeb (o fundo de manutenção da educação básica). A Lei do Piso dos professores, de 2008, vincula o reajuste à legislação do antigo Fundeb — que foi revogado em 2020 pela Emenda Constitucional do novo fundo, que agora é permanente.
Essa regra antiga ligava o reajuste, por exemplo, à variação do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), arrecadado pelos estados. Como em 2020 a arrecadação do tributo caiu, por conta da pandemia de Covid-19, sequer houve aumento do piso no início do ano passado.
Para este ano, a arrecadação dos estados subiu, fazendo o reajuste do piso salarial, pelos critérios antigos, chegar a 33,23%, atingindo aproximadamente R$ 3.800.
Agora, o governo prepara uma MP para definir novos parâmetros para o reajuste anual do piso. É preciso dar um reajuste no piso salarial para que os estados e municípios cumpram o gasto mínimo determinado pela Constituição com educação e com salários de professores.
As mudanças nas regras de reajuste, porém, desagradam os profissionais. São 1,7 milhão de profissionais que podem travar uma batalha judicial para que o aumento siga as regras antigas, como mostrou o GLOBO na semana passada.
Sindicatos reivindicam o reajuste de 33,23%, defendendo que os critérios previstos na lei antiga do Fundeb apenas foram transpostos para a legislação mais recente, e ressaltando que a lei que trata do piso salarial dos professores continua a vigorar. As entidades prometem judicializar a questão, caso estados e municípios determinem aumentos menores do que esperam.
A Consultoria Jurídica do MEC emitiu parecer defendendo que os critérios vigentes até o ano passado perderam a validade com a aprovação do novo Fundeb.
A mudança dos critérios também atende a uma pressão de prefeitos e governadores, para quem os reajustes são muito elevados — o piso subiu 66% em termos reais de 2008 a 2021; em valores nominais, saiu de R$ 950 para R$ 2.886.
Há uma preocupação dos governadores e prefeitos de não conseguirem fechar as contas caso o aumento seja muito elevado. Além disso, a tendência é que outras categorias (como policiais e bombeiros) pressionem por um mesmo patamar de reajuste, o que gera um efeito cascata sobre as contas locais.
Salário baixo
Embora cause impacto nas contas dos governos, o salário dos professores do país está entre os mais baixos do mundo. Um relatório divulgado em setembro pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) apontou que a média do salário inicial dos professores dos anos finais do ensino fundamental é a menor entre 40 países analisados. As outras nações com remunerações iniciais mais baixas para os docentes são Costa Rica, Hungria e Letônia.
O estudo Education at a Glance 2021 aponta que os professores brasileiros começam recebendo, em média, cerca de US$ 13,9 mil. A média nos países membros e parceiros da OCDE analisados é de US$ 35,6 mil. Os salários iniciais mais altos, em Luxemburgo e na Alemanha, passam de US$ 70 mil por ano.
A conversão para dólares é feita usando a escala de paridade do poder de compra, que busca equalizar o poder de compra das diferentes moedas, eliminando as diferenças de níveis de preços entre os países.
Em relação ao chamado salário real, que leva em consideração também os bônus e pagamentos adicionais, a média no Brasil para professores dos anos finais do ensino fundamental entre 25 a 64 anos é de US$ 25,7 mil por ano, também abaixo da média da OCDE, de US$ 47,9 mil anuais.
Reportagem do GLOBO publicada na semana passada mostrou que os municípios e os estados defendem a mudança na regra.
— Não estamos defendendo que os vencimentos dos profissionais sejam reajustados apenas pela inflação, mas somente o piso salarial. E que os ganhos reais dos professores sejam negociados por cada ente federado — disse Mariza Abreu, consultora da Confederação Nacional dos Municípios.
Líder de relações governamentais do Todos Pela Educação, Lucas Hoogerbrugge vê um caminho intermediário como a melhor saída. Ele aponta que os reajustes podem se tornar insustentáveis nos patamares atuais, pelos critérios até então usados, mas discorda que sigam apenas a inflação.
— Vai matar qualquer tipo de valorização real. Perde-se o projeto de valorização dos professores quando se defende que qualquer ganho real tem que ser negociado individualmente nos mais de 5.500 municípios — alerta.
O governo também estuda acabar com a obrigação, presente na lei atual do piso, de complementação federal para estados e municípios que não conseguem cumprir o valor mínimo que todo professor deve receber na educação básica pública. Essa complementação nunca foi cumprida na prática.
O Globo