Emendas individuais têm brecha para gasto de até R$ 10,6 bilhões sem transparência

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As emendas individuais ao Orçamento federal, indicadas por cada senador ou deputado, praticamente dobraram de valor em 2023. Saltaram da previsão inicial de R$ 11,7 bilhões para R$ 21,2 bilhões – 81,2% a mais.

O aumento ocorre na esteira da extinção do “orçamento secreto” por decisão do Supremo Tribunal Federal (STF). As emendas de relator, agora extintas, também ocultavam indicações individuais de parlamentares, sem “assinaturas” ou critério bem definidos.

As emendas individuais são divididas de forma igualitária entre os parlamentares e, por isso, consideradas de melhor qualidade. Há uma brecha, no entanto, que ainda possibilita gastos com baixíssimas fiscalização e transparência.

Isso porque metade do valor dessas emendas – ou seja, R$ 10,6 bilhões em 2023 – pode ser gasta como “transferência especial”.

E aí, o dinheiro é enviado diretamente ao caixa da prefeitura ou do estado beneficiado. Sem convênio, sem apresentação de projeto ou qualquer indicação de uso do recurso. Ou seja: não há como fiscalizar qual função o dinheiro terá “na ponta”.

Além disso, por ser uma espécie de “doação” da União aos governos locais, não fica claro quem tem o papel de fiscalizar: os tribunais de contas locais ou os órgãos federais. Com isso, nenhum dos lados fiscaliza o dinheiro.

Essas características levaram a um apelido: as transferências diretas passaram a ser chamadas de “emenda PIX” ou, em uma versão mais antiquada, “emenda cheque em branco”.

Atualmente, há dois processos questionando o mecanismo em análise no Tribunal de Contas da União (TCU). Um deles foi aberto a pedido do próprio Congresso, feito pela Comissão de Fiscalização Financeira e Controle da Câmara.

Os processos começaram a ser julgados no último dia 13, mas houve pedido de vista (mais tempo para analisar o caso) por parte do ministro Benjamin Zymler.

Gasto sem transparência cresceu 434%

Nos últimos anos, as “emendas PIX” dispararam. Passaram de R$ 621,2 milhões, em 2020, para R$ 3,3 bilhões em 2022. Ou seja, um crescimento de 434%, segundo dados da consultoria de Orçamento da Câmara. Os números de 2023 ainda estão sendo consolidados, mas podem chegar a R$ 10,6 bilhões.

Dados do ministério da Economia compilados pelo TCU apontam que, dos R$ 2,6 bilhões pagos em 2020 e 2021, nessa modalidade de emenda PIX, apenas R$ 121,8 mil foram declarados pelos estados e municípios.

Essas informações precisam constar na plataforma +Brasil – site que detalha as transferências para os entes da federação.

Como foram criadas as ‘emendas pix’?

Esse tipo de gasto foi criado em 2019, por meio de uma proposta de Emenda à Constituição (PEC). A autoria foi da deputada e hoje presidente do Partido dos Trabalhadores, Gleisi Hoffmann (PT-PR). O relator foi o deputado Aécio Neves (PSDB-MG).

Naquele ano, os parlamentares defenderam a medida como forma de desburocratizar o uso das emendas parlamentares e dar maior agilidade à liberação das verbas.

Redistribuição do orçamento secreto

Após o STF extinguir o orçamento secreto, o Congresso Nacional redistribuiu esses valores por meio da PEC da Transição. E, dessa maneira, as emendas individuais foram turbinadas.

Dos R$ 19,4 bilhões reservados ao orçamento secreto em 2023, R$ 9,5 bilhões foram remanejados para as emendas individuais, que são impositivas. Ou seja, elas têm que ser executadas de forma obrigatória pelo Executivo.

A partir de agora, a União fica obrigada a pagar as emendas individuais em um limite de 2% da receita corrente líquida (soma das receitas do governo provenientes de tributos, excluídas as transferências constitucionais para estados e municípios). Antes, o limite era de 1,2%.

Os outros R$ 9,85 bilhões foram redirecionados ao governo federal – que, teoricamente, tem que definir as áreas que receberão a verba.

Alerta

Técnicos do Congresso alertam, no entanto, para um dispositivo que foi incluído na Lei Orçamentária Anual (LOA) de 2023, que limitou a distribuição desses recursos por parte do Executivo. Isso porque a União só poderá remanejar essa cifra com o aval do relator-geral do Orçamento.

Há o entendimento, portanto, de que os parlamentares conseguirão, ao menos em 2023, manter a influência sobre esses recursos bilionários, porque eles simplesmente estarão descritos de uma outra maneira no Orçamento.

No caso do orçamento secreto, agora extinto, os recursos eram identificados com a rubrica “RP9”. Apesar de a modalidade abrir brechas para manter oculto o nome do parlamentar que fez a indicação, a rubrica própria permitia identificar que aqueles recursos eram de emendas de relator.

Agora, com a derrubada da rubrica “RP9”, técnicos temem que um montante bilionário continue, na prática, nas mãos do relator do Orçamento. E, por consequência, da cúpula do Congresso.

Além disso, a identificação dos recursos seria ainda mais difícil, já que eles seriam descritos com a rubrica “RP2”, podendo ser confundidos com outras despesas do governo.

G1

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